quarta-feira, 30 de março de 2016

(“COMO AGARRAR UM MILIONÁRIO”, JEAN NEGULESCO, 1953, EUA): (“TRÊS LOIRAS CAÇA-DOTES”)

(“COMO AGARRAR UM MILIONÁRIO”, JEAN NEGULESCO, 1953, EUA):

(“TRÊS LOIRAS CAÇA-DOTES”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“Aproveitando a última enquete do grupo do Facebook, Clássicos do Cinema, proposta pelo eclético Thomaz Antônio F. Dantas, sobre os cinco melhores filmes escapistas, dos dez propostos pelo nosso amigo, dois eleitos foram dirigidos por Jean Negulesco, um deles é “Como agarrar um milionário”, de 1953. Uma comédia amalucada, sensual, escapista, mas com um bom roteiro. O material original são duas comédias da Broadway, que foram reescritas com habilidade por Nunnally Johnson.

O filme é mais uma proposta rotineira e rentável para explorar a química de um elenco feminino belo e sensual, como funcionou a dupla Marilyn Monroe e Jane Russell, em “Os homens preferem as loiras”, de Howard Hawks.



 “Como agarrar um milionário” reúne três loiras, a grande atriz Lauren Bacall de personagens fatais em films noir, mas com excelente versatilidade para fazer personagens leves em comédias românticas e escapistas. Betty Grable é uma versátil atriz-dançarina-cantora, estrelou diversos musicais, co-estrelou filmes com Carmen Miranda, e, lógico as comédias escapistas. Estas duas atrizes juntam-se a Monroe, uma loira sensual, mas com olhar inocente.


As três personagens são caçadoras de dotes, alugando um apartamento, para atrair os ricaços. Negulesco utiliza bem o Cinemascope, objetivo principal da Fox, no filme em tela, inclusive, o prólogo, com uma abertura musical, com orquestra enorme regida por Thomas Newman, ressalta bem aquele recurso, balizando a orquestra no vai-e-vem da câmera. O cinemascope é um recurso que aumentava a tela dos cinemas ainda mais (resolução), para voltar a atrair o público para o cinema, já que aquele estava sendo seduzido pela TV, mas, esta, ainda em preto-e-branco e com tela reduzida. Negulesco demonstra domínio da técnica e foi um dos grandes cineastas de Hollywood da Era de Ouro.”




sábado, 26 de março de 2016

(“A DAMA FANTASMA”, ROBERT SIODMAK, EUA, 1944): (“A FEMME FATALE ARQUETÍPICA DO NOIR”)

(“A DAMA FANTASMA”, ROBERT SIODMAK, EUA, 1944):

(“A FEMME FATALE ARQUETÍPICA DO NOIR”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“Um homem briga com sua esposa, sai de casa rumo ao bar, com o intuito de beber para aclarar as ideias e encontra uma dama misteriosa do título. Uma mulher sem nome e passam a noite juntos, sem adultério. A dama fantástica é a femme fatale típica dos film noir, sedutora, bela, misteriosa e perigosa para o destino final dos protagonistas masculinos. Aqui temos o arquétipo excelentemente delineado por Siodmak da mulher fatal, ou femme fatale noir.


O homem passa a ser acusado de ter assassinado a mulher, mas sem álibi, ou melhor, o tem, mas onde encontrar a dama fantasma? Ninguém, além dele, a viu. Uma trama policial se monta e com toques de surrealismo, conflitos psicológicos, temos uma obra ímpar do cinema noir dos anos 1940.”



(“OS CORRUPTOS”, FRITZ LANG, EUA, 1953): (“NOIR VIOLENTO E TENSO”)

(“OS CORRUPTOS”, FRITZ LANG, EUA, 1953):

(“NOIR VIOLENTO E TENSO”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)




“Depois de uns quinze filmes em seu país natal, com a ascensão do partido nazista e de Hitler, Fritz Lang emigrou para os Estados Unidos depois de breve passagem (e um longa realizado na França em ’34). Mas, ainda, inicialmente, na Alemanha, realizou obras-primas do cinema silencioso e do cinema como um todo, filmes exemplares do melhor do expressionismo alemão, como: “Metropolis”, “A morte Cansada” e “M”.

 Sua “fase americana”, que vai de Fúria (1936) até Suplício de uma alma (1956), com outros vinte longas por ele assinados, é uma filmografia marcada por excelentes films noir. Além de filmes sobre a pena de morte - como os dois já citados e que unem as duas pontas de sua cinematografia em Hollywood. As películas “noir”, por sua vez devedoras do expressionismo alemão do tempo dos filmes silenciosos - e não por acaso, Os Corruptos é um dos melhores exemplares, tanto do cinema “noir” americano, como da obra de Lang.


Os Corruptos é um noir forte, tenso e violento. O protagonista vivido por Glenn Ford começa a agir fora-da-lei, ao se demitir da polícia, para que possa realizar sua vingança pessoal. A personagem age, à margem da lei, para obter a justiça devida e à qual os meios legais não possibilitam, por causa da corrupção policial e dos políticos que subornam e fazem com que os policiais fiquem submetidos às suas ordens e intenções.”


quinta-feira, 24 de março de 2016

(“O JUSTICEIRO”, ELIA KAZAN, EUA, 1947): (“DRAMA DE TRIBUNAL EM UM FILM NOIR”)

(“O JUSTICEIRO”, ELIA KAZAN, EUA, 1947):

(“DRAMA DE TRIBUNAL EM UM FILM NOIR”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)






“Elia Kazan já demonstra maestria em seu terceiro filme, um film noir, com doses de drama de tribunal, tom de falso documentário e denúncia política. O enredo do filme parte de um assassinato de um padre querido pela comunidade de uma cidade, como a polícia demora a capturar o verdadeiro culpado, a população da comunidade se revolta e pede justiça, que se juntam às pressões dos jornalistas, que fazem um jornalismo sensacionalista e dos próprios políticos de Connecticut, que pressionam a polícia a “arranjar” um culpado, um bode expiatório.

Harvey (Dana Andrews, excelente nas cenas do julgamento) é o advogado escolhido para defender o suspeito que foi preso acusado do crime do assassinato do padre, um rapaz, que Harvey acredita na sua culpabilidade, porém, com o decorrer de suas investigações convence-se da inocência do jovem.


O filme ainda aproveita para criticar a mídia sensacionalista, os políticos aproveitadores e corruptos, polícia também, que promove a tortura no interrogatório do suposto criminoso. Excelente film noir.”

(“MORTALMENTE PERIGOSA”, JOSEPH H. LEWIS, EUA, 1950): (“CASAL DE ATIRADORES: BONNIE E CLYDE NOIR”)

(“MORTALMENTE PERIGOSA”, JOSEPH H. LEWIS, EUA, 1950)

(“CASAL DE ATIRADORES: BONNIE E CLYDE NOIR”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“MORTALMENTE PERIGOSA é dirigido pelo lendário e, infelizmente, subestimado cineasta Joseph H. Lewis. Um excelente diretor de filmes de baixo orçamento que hoje são considerados cults e reverenciados pelos amantes da Sétima Arte.

 Barton desde pequeno tem obsessão por armas, ao roubar uma, ainda criança, vai parar no reformatório. Depois da decisão do juiz o filme salta para Barton adulto (John Dall), seu retorno à cidade, com disposição para ser um cidadão de bem, ainda que sua obsessão por armas não tenha deixado de existir em sua personalidade.

Barton se apaixona por Annie, moça que apresenta um show de tiros em um circo, vivida por Peggy Cummins. Annie é a femme fatale típica do cinema noir. É Annie quem acaba levando Barton para o mundo do crime, insatisfeitos com o pouco que ganhavam honestamente. Daí ele ter aceitado a vida do crime, só para continuar junto com Annie.

MORTALMENTE PERIGOSA é um filme que tanto é da tradição dos films noir, que propõe ao espectador o ponto de vista dos bandidos, e por isso fazem com que nos solidarizemos com eles e suas tragédias pessoais.


 Lewis aproveita e faz duras críticas à sociedade estadunidense em seu filme: uma: a obsessão por armas e a outra crítica ao consumismo/capitalismo.”

(ARDIL 22, MIKE NICHOLS, EUA, 1970): (A LOUCURA DE UMA GUERRA ARDILOSA)

(ARDIL 22, MIKE NICHOLS, EUA, 1970):

(A LOUCURA DE UMA GUERRA ARDILOSA):

(CRÍTICA POR RAFEL VESPASIANO)






Ardil

substantivo masculino

1.    1.

ação que se vale de astúcia, manha, sagacidade; ardileza.

2.    2.

ação que visa iludir, lograr (pessoa ou animal); armação, cilada.



“Mike Nichols realizou, em 1970, uma comédia de humor irônico extremo, de caráter antibelicista, aproveitando o contexto da Segunda Guerra Mundial. Que serve de metáfora e ironia para criticar também a loucura da corrida armamentista e a paranoia da Guerra Fria dos anos 1970, entre EUA e URSS. O filme permanece muito atual.

O nonsense do filme serve justamente para mostrar a loucura e a estupidez das guerras. O ardil 22 é um código, lei, que os militares superiores dos EUA utilizam para que os soldados norte-americanos continuem lutando, sem que possam ser dispensados para voltar para casa, depois de tantos anos em batalhas.

O ardil simplesmente consiste em guerrear e continuar a guerrear, sem um objetivo específico. E os coronéis e generais afirmam pelo código ardil 22 que os sãos mentais devem continuar na guerra, pois, supostamente estão “lúcidos, por isso devem permanecer e continuar bombardeando a Itália fascista; contudo, os que sofrem de transtornos psíquicos provocados pelo horror da guerra, mesmo considerados “loucos”, devem continuar pilotando bombardeiros, ou seja, não há dispensa para ninguém, pois os “doidos”, segundo os superiores são os melhores para a Guerra, e, os sãos também servem para a guerra pela sua lucidez, já aqueles, como “malucos”, não têm nada a perder.

Mas quem entre são e loucos querem lutar uma guerra que não é deles e não significa nada direta ou indiretamente para eles? Que já perdeu o sentido.


É uma guerra nonsense, sem objetivo e/ou finalidade, sem fim, um nunca terminar. Os militares superiores e os políticos são mais mentecaptos do que os soldados, que estão todos os dias no front de batalha.”






sexta-feira, 4 de março de 2016

(“A ESPADA DO MAL”, HIDEO GOSHA, JAP, 1965): (“A FRUSTRAÇÃO DE UM SAMURAI”)

(“A ESPADA DO MAL”, HIDEO GOSHA, JAP, 1965)

(“A FRUSTRAÇÃO DE UM SAMURAI”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“A espada do mal retrata as tentativas de um ambicioso samurai, que para melhorar suas condições de vida, concorda e aceita as ordens de um dos chefes do seu clã, para matar um oficial do mesmo clã. O que acaba se concretizando.


Porém, ocorre uma traição e o enredo, muito bem conduzido por uma direção cautelosa e detalhada de Gosha, toma outros rumos. O samurai torna-se um ronin, samurai sem suserano, um ronin triste, rancoroso, amargo e frustrado, sem rumo, meio ao acaso junta-se a um bando de criminosos. E sua espada passa a ser bastante requisitada. O filme é forte e é um violento chambara.”






(“O FILHO DO DESTINO”, KENJI MISUMI, JAP, 1962): (“UM CHAMBARA FATALISTA”)

(“O FILHO DO DESTINO”, KENJI MISUMI, JAP, 1962)

(“UM CHAMBARA FATALISTA”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“Uma família acolhe um bebê, após seus pais terem sido brutalmente assassinados. Os pais adotivos não revelam suas origens e ele cresce acreditando, que aqueles eram de fato seus pais de sangue. Vivia tranquilamente uma vida civil, mas, o acaso, faz que ele se transforme em um samurai em busca de vingança e redenção.

Quando ele descobre a verdadeira origem, não pensa em mais nada, a não ser em vingar-se. Apesar dos rogos dos pais que o criaram, ele parte para uma luta desigual, que poderá ser trágica, porém da qual ele não fugir, esta é sua sina: vingar-se.


Misumi dirige um onírico filme e um dos melhores chambaras da história.”




(“SAMURAI ASSASSINO”, KIHACHI OKAMOTO, JAP, 1965): (“UMA BATALHA CHAMBARA ÉPICA”)

(“SAMURAI ASSASSINO”, KIHACHI OKAMOTO, JAP, 1965)

(“UMA BATALHA CHAMBARA ÉPICA”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“O regime feudal no Japão está com os dias contados, o Xogunato está em conflito com o premier japonês e este está abrindo o país ao Ocidente (EUA). Um ronin (Toshiro Mifune), acaba se envolvendo na trama política dos poderosos, e, é contratado para assassinar o premier. O filme tem o seu enredo desenvolvido sem pressa, minuciosamente, para que o espectador entenda os meandros da política suja que estava sendo feita à época, contra os interesses do povo civil japonês, com a entrada dos EUA, para aproveitar-se do país.


E chega-se à batalha final: antológica, épica e belamente filmada e coreografada, que é o auge do filme e um dos mais belos momentos do cinema chambara japonês. Okamoto realiza um chambara ímpar.” 



(“TIRANIA”, HIDEO GOSHA, JAP, 1969)

(“A VINGANÇA TARDA, MAS É IMPLACÁVEL”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“Hideo Gosha atinge, para muitos críticos, o seu apogeu como cineasta, neste chambara invernal. Um filme belamente montado e fotografado. Com a temática da vingança, dentro do próprio clã. Uma vingança alimentada por anos, por um samurai que não concordou com o massacre feito pelo clã, que exterminou uma vila inteira de pescadores, o intuito do clã era para recuperar financeiramente o mesmo.

Passam-se anos, e, quando o clã planeja um massacre parecido, o samurai fica sabendo, então decide empreender, finalmente, a tão almejada vingança, em particular, duelar, com um dos chefes do clã, que o humilhou e maltratou anos atrás.


Os duelos finais são brilhantemente dirigidos e coreografados, o roteiro desenrola-se contemplativo, mas quando chega-se ao clímax da batalha final, a violência é filmada nua e cruamente, sem subterfúgios de eufemismo. As cenas do mar e das costas marítimas, com navios transpondo tais águas são antológicas.”

quinta-feira, 3 de março de 2016

(“O NATIMORTO”, LOURENÇO MUTARELLI): (“A UNIDADE E CISÃO DO NARRADOR-PERSONAGEM D´O NATIMORTO”)

(“O NATIMORTO, UM MUSICAL SILENCIOSO”, LOURENÇO MUTARELLI)

(“A UNIDADE E CISÃO DO NARRADOR-PERSONAGEM D´O NATIMORTO”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)







"O AGENTE - É QUE, QUANDO EU ERA ADOLESCENTE, EU FIZ MINHA PRIMEIRA VIAGEM AO EXTERIOR. QUANDO VOLTEI, MINHA TIA HAVIA SOFRIDO UM DERRAME. E ELA NÃO SE LEMBRAVA DE MIM.
A VOZ - BOM, MAS SE FOSSE ASSIM, COMO VOCÊ DIZ, NINGUÉM MAIS SE LEMBRARIA DE VOCÊ, NEM SEUS AMIGOS, NEM SEUS PARENTES.
(...)
O AGENTE - É QUE, QUANDO OS REVEJO, ELES SE LEMBRAM; EU SÓ DEIXO DE EXISTIR DURANTE A MINHA AUSÊNCIA."



“Lourenço Mutarelli é um escritor que se notabiliza pelo desconcerto que provoca no leitor, basta citar um dos seus romances mais famosos, O cheiro do ralo. Em O natimorto, o autor vai além e transtorna todos os limites de uma leitura “agradável e tranquila” de sua obra, seu romance é inquietante e provocante. O livro é híbrido, característica sintomática da literatura pós-moderna, mistura-se gêneros romance e teatro. Como exemplo parecido de tal artifício tem-se o livro de Sérgio Sant´Anna, "Um romance de geração".

Um narrador-personagem, à beira, da desintegração como ente, que passa do uno para um ser cindido, o que já se concretiza e se efetiva na linguagem do próprio texto, por meio do uso de figuras de linguagem, como os paradoxos e as antíteses. Pode-se falar até em romance “neobarroco”, pois, durante a leitura d´O natimorto, aparecem vários pares de dualidade dinâmica, opostos complementares, dos quais nos fala F. Schlegel, a ironia da parábase, esta teoria que surge no Romantismo Alemão, mas nos ajuda a entender a obra pós-moderna de Mutarelli, já que o estilo Barroco seiscentista, era marcado pela contradição e pela cisão do ser, de um eu-lírico dividido, por exemplo entre o sagrado e o profano; e, no Romantismo Alemão, como também no Francês, tinha-se o belo e o disforme, "o grotesco e o sublime", teorizado pelo francês Victor Hugo, em seu prefácio ao Crowell,  o que corrobora o exposto até aqui sobre a obra de Lourenço Mutarelli. 

Já que a narrativa d´o agente, narrador-personagem, do romance em tela, é marcada por vários opostos que se complementam e não existiram um sem o outro, tal deus não existe sem o diabo, ou o bem não se configura sem a presença do mal. O neobarroquismo do livro está, justamente, neste processo dual dinâmico, que ressalta a cisão e a desestruturação do ente, principalmente, no seu isolamento e nos seus devaneios, que promovem o desgaste de sua personalidade e caráter, influindo para que o narrador-personagem passe a viver um tormento psicológico ininterrupto. 

Há vários pares duais e contraditórios que compõem e decompõem a personagem, além do citado acima, tem-se: o bem-mal, belo-grotesco, uno-decomposto, inocente (puro)-malvado (esperto), etc. O romance de Lourenço Mutarelli é uma metáfora da vida, o próprio título já sugere, que o protagonista nasce para morrer, como todos os seres humanos. A vida pede a morte e vice-versa. O protagonista no caos de sua vida com várias desilusões e aspectos negativos que marcaram toda sua vida, toda sua existência, marcada sempre pela queda, outro par dual dinâmico, ascensão-queda, pois o nascimento, de certa forma, é o surgir para o mundo (ascensão), mas a sua existência foi marcada por erros, maldades, um caráter e uma personalidade duvidosa e corrompida, com distúrbios e desvios, transtornos, que levam o narrador-personagem à queda irreversível do seu ser -, a sua aniquilação e nulificação, que até certo ponto remete ao niilismo de Nietzsche -, no caso do texto do escritor brasileiro, a própria morte do narrador-personagem, se dá num ato metafórico e alegórico de antropofagia canibalesca em abismo, o que remete ao termo que dá título ao livro, natimorto

Uma queda que poderia se dá como uma catábase, uma descida aos infernos, para depois ascender e, caracterizar uma epifania do eu, conforme também as teorias do poeta-filósofo F. Schlegel ressaltam. Porém, isso não ocorre, mas sim uma maior desestabilização do seu eu, que caiu, cindiu sua personalidade, cada vez mais confusa e desintegrada. Que, ao final do romance, o ente não tem possibilidade de redenção ou recuperar sua unidade (ou tem?), pois o final é em aberto, contudo percebe-se sua autodestruição antropofágica canibalesca, ressaltando um ser desintegrado, desestruturado, cindido e dividido, prestes a mais uma queda, a queda final. No fim, o narrador-personagem só tem a certeza, que nos é dada pelo título do romance, nasceu para morrer, como se não tivesse vivido, o Natimorto. 

Mas, pode-se interpretar o desfecho do livro com um viés mais esperançoso e redentor, de retorno ao caos original, ao nascimento até mítico, ao ressurgimento do ser em um novo nascimento, de caráter mítico-arquetípico. Esta linha de pensamento é possível, porém, a primeira interpretação e que foi desenvolvida na minha crítica, tenho a impressão é mais plausível, e, a que prefiro, pois se afina mais com minha linha de pensamento e com os meus estudos teóricos."


  "É NOITE/QUANDO ACORDO,/SUPONHO,/NUNCA ABRO AS CORTINAS./NADA SEI/SOBRE O MUNDO/LÁ FORA./SURPREENDO-ME/COM MEU OBSCURO/MUNDO/INTERIOR./DESEJO/DE MORTE." 




(“GUERRA, FLAGELO DE DEUS”, ALE, GEORG W. PABST, 1930)

(“A LOUCURA E A DEVASTAÇÃO NO FRONT DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“Pabst realiza uma obra-prima de crítica contundente ao belicismo reinante nos primórdios do século XX. No filme, o diretor opta pelo ponto de vista de soldados alemães que invadem a França, mas na verdade, nem os primeiros, nem os franceses deveriam está ali, num front de guerra, nas trincheiras, pois a guerra é insana, inútil e uma realidade que não é causa-consequência de nenhum dos lados, porém, de uma causa atemporal: as insanidades dos homens em se aprofundarem em batalhas sem sentido, e, quem sabe Deus esteja muito triste com o rumo e as atitudes de sua ‘suprema criação’: o homem.


O tom do filme é o de não existir lado ‘certo’ ou ‘errado’, tudo é: loucura, dor, desespero, insanidade e sem esperança para os pobres combatentes nas trincheiras da guerra. As cenas que denunciam os agonizantes combates nas trincheiras, possuem diálogos e sons da guerra e dos embates, que ressaltam e são característicos de uma insanidade, barbaridade e enlouquecida realidade, um flagelo universal: a GUERRA.”



terça-feira, 1 de março de 2016

(“LEVADA DA BRECA”, HOWARD HAWKS, 1938): (“COMÉDIA MALUCA, INTELIGENTE E COM DIÁLOGOS RÁPIDOS E AMALUCADOS”)

(“LEVADA DA BRECA”, HOWARD HAWKS, 1938)


(“COMÉDIA MALUCA, INTELIGENTE E COM DIÁLOGOS RÁPIDOS E AMALUCADOS”):


(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“O versátil e correto diretor Howard Hawks reúne um casal de atores, que vivem personagens antagonistas, mas opostos que se complementam: David (Cary Grant), o paleontólogo atrapalhado e abobalhado e a personagem de uma inspirada Katherine Hepburn, Susan, uma mulher independente, espevitada e estabanada.

“Grant é uma espécie de Charles Chaplin (...) do cinema falado, por suas atuações sempre calcadas no humor e na agilidade corporal” (GUIMARÃES, 2014, p. 9), é o que se verifica com muito humor em Levada da Breca, com o ator exibindo todo o seu talento cômico.

Hepburn e Grant protagonizam duelos verbais (rápidos diálogos) típicos das “comédias screwball”, típica da Hollywood, dos anos 1930-1940, comédias malucas, amalucadas. “Comédias de ritmo frenético [é o caso de Levada da Breca] sobre desencontros amorosos” (GUIMARÃES, Ibidem.,  p. 19). Nas quais “rir é o melhor remédio” (CARLOS, Ibidem., p. 44), pois o contexto socioeconômico dos Estados Unidos da América era o da Grande Depressão Econômica, com a queda da bolsa de valores de New York, em 1929, o auge das comédias screwball é, justamente, vivenciada nas décadas de 30 e 40, do século XX.

Detalhe I: O leopardo, o brontossauro e um cachorro unem o atrapalhado e desastrado David e a estabanada, Susan. Detalhe II: são para três cenas que acho hilárias, eis elas: 1) vestido rasgado de Susan e o fraque rasgado de David; 2) a cena do xerife, na delegacia, com todo o elenco reunido para o clímax, numa cena hilária; 3) e, a cena final, epílogo, no museu, uma cena que derruba tudo ao final do filme.”




REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:


GUIMARÃES,  Pedro Maciel e CARLOS,  Cássio Starling. Cary Grant [em] Levada da Breca. São Paulo: Folha de S. Paulo, 2014.

(“ENTRE DOIS FOGOS”, ANTHONY MANN, 1948): (“A VINGANÇA NUM NOIR VIOLENTO E DEVANEANTE”)

(“ENTRE DOIS FOGOS”, ANTHONY MANN, 1948)

(“A VINGANÇA NUM NOIR VIOLENTO E DEVANEANTE”):

(CRÍTICA POR RAFAEL VESPASIANO)





“Um filme menor dos dirigidos por Mann, mas Entre dois fogos é um belíssimo exemplar do cinema noir, sim. O enredo é o conflito entre dois gangsteres, com uma temática amorosa entremeado o enredo, um triângulo amoroso, entre um dos gangsteres e as duas mulheres da sua vida, a do passado e a do presente.


O cineasta é impessoal a apresentar a história, com uma ambiência noir onírica, com ruas escuras, enevoadas e trágicas. Este tom lúgubre e sombrio, típicos de um sonho ou devaneio é que ressaltam a tragicidade do filme e o onirismo do mesmo. O que importa, para nós espectadores, não é muito o enredo, o triângulo amoroso e a disputa entre os dois rivais e a busca de vingança. Porém, sentir a atmosfera de devaneio e, a ambiência, que embora o diretor marque por uma direção impessoal, é um ambiente com aspecto trágico, típico de um pesadelo angustiante, para todas as personagens de Entre dois fogos.”